Os dados do Censo 2022: Composição Domiciliar apontam que 5.2% da população de Santa Gertrudes possui alguma deficiência, o que representa 1.191 habitantes com dois anos ou mais. Além disso, foram identificados 276 indivíduos (1.2%) com algum grau do transtorno do espectro autista, dados coletados pela primeira vez pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O jovem Miguel Barboza Silva, de sete anos, se insere nesta estatística. Filho de Tatiana Leite Barboza Silva, o garoto tem transtorno do espectro autista nível 1 de suporte e realiza tratamentos e terapias ao longo da semana, além de estudar na Escola Municipal Ivone Aparecida Gomes Palumbo.
Em entrevista ao portal SGon, Tatiana relata o trabalho voltado para a inclusão realizado pela escola na qual Miguel estuda. “A escola acolheu muito bem meu filho. Eles entenderam o jeitinho dele e procuram a cada dia ajudar ele da melhor maneira possível, procurando sempre respeitar os desafios diários enfrentados”, relata.
Para ela, a criação do Núcleo de Atendimento Multidisciplinar (NAM) se transformou em uma política pública efetiva para esta população. “Muitas crianças estavam desassistidas de terapias e as famílias precisavam se deslocar para outras cidades”, comenta ao comemorar sobre o serviço.

Conscientização
Mesmo considerando que o município está com os olhos voltados para para autistas e deficientes, Tatiana considera que seria importante mais investimentos em conscientização sobre o tema. “Deveria ter mais cartazes nos órgãos públicos, cartilhas falando sobre o autismo, [síndrome de] down, e outras deficiências. Não somente no dia de conscientização, mas o ano inteiro, principalmente em hospitais, onde muitos autistas se desregulam por ter muita gente e as vezes pela demora no atendimento”, reflete.
Para ela, o trabalho de conscientização, nos órgãos públicos como hospitais, escolas, entre outros, faria com que o acolhimento durante as crises fosse mais empático e eficaz. “Seria interessante ter um trabalho de conscientização e aprendizado sobre autismo e demais deficiências nas escolas também, até porque, na própria escola muitos autistas têm crises. E saber ajudar e acolher, faz toda diferença”, completa.
Dificuldades
Como mãe atípica [termo que define mães com filhos com alguma condição como deficiência, síndrome ou transtorno], Tatiana relata também as dificuldade que enfrenta, uma vez que precisa se dedicar aos cuidados do filho. “Como uma mãe atípica que vive uma rotina cansativa e exaustiva, infelizmente não consigo me recolocar no mercado de trabalho, até porque a jornada de trabalho exigida pela CLT são 8 horas diárias”, expõe.
Sua proposta para que este entrave seja solucionado é a criação de uma espécie de “programa” para reinserção destas mães no mercado de trabalho. “Os órgãos públicos poderiam abrir espaço a essas mães com trabalho de meio período, como monitoras, faxineiras, secretárias, entre outras atividades. Muitas famílias só dependem do salário do esposo e, pra quem não sabe, muitos autistas são seletivos, usam fraldas, só se alimentam com fórmulas, outros só de frutas, e muitas dessas mães se sentem de mãos atadas sem poder ajudar os esposos”, esclarece ao lembrar ainda das mães solo, que foram abandonadas pelos seus companheiros e arcam com a responsabilidade sozinhas.
Tatiana revela ainda que sofre preconceito, mas que enfrenta de corpo aberto. “Principalmente com olhares julgadores. Mas não ligo, aonde eu vou, levo ele com o cordão de identificação e falo: ‘Não liguem ele é autista’. E sigo em frente com uma frase: ‘os incomodados que se retirem'”, completa.
Inclusão nas escolas

O professor de educação física da Escola Estadual Maria Carmen Codo Jacomini, Vitor Minatel, acredita que a simples presença de alunos com deficiência ou transtornos como o autismo em sala de aula não assegura a inclusão. “É preciso adaptação pedagógica consciente e planejada”, explica.
O profisional, que também é graduado em Educação Especial e pós-graduado em educação física adatada à inclusão, acredita que preparo das aulas adaptadas garante acesso real e significativo ao aprendizado.
“As atividades adaptadas partem do mesmo conteúdo previsto para a turma, mas são ajustadas em forma, recursos, linguagem, tempo ou objetivos. A ideia central é manter o aluno incluído no processo de aprendizagem, mesmo que ele siga um percurso diferente. E também diversificam da estratégia de cada professor, nosso dever como professores é continuar estudando e evoluindo para que nós profissionais da educação possamos estar sempre preparados”, esclarece.
Minatel refuta a ideia do profissional ser “unicamente apaixonado pela área”. Ele considera que ser um entusiasta do tema faz diferença, mas não deve ser a única ou principal característica para que um profissional atue com qualidade junto ao público com deficiência ou com transtornos como o autismo.
“É uma responsabilidade profissional, não uma missão pessoal. Reduzir o trabalho com pessoas com deficiência a uma questão de ‘vocação’ ou ‘amor’ pode ser perigoso. Isso pode romantizar a prática”, pondera.
Por fim, o professor destaca que as escolas tem se esforçado para trabalhar a inclusão em seus currículos. “Em todas as escolas em que trabalhei a gestão vem se esforçando cada vez mais para poder dar o acolhimento necessário”, finaliza.
Vale destacar que o professor também desenvolve trabalho no esporte de alto rendimento nas categorias de base do Rio Claro Futebol Clube.
Ranking
Santa Gertrudes está na 5.044ª posição no ranking de pessoas com deficiência entre as cidades do país. Já no ranking de pessoas diagnosticadas com autismo, o município figura na 1.208ª posição.
Conforme o levantamento, são consideradas pessoa com deficiência os declarantes com algum grau de dificuldade funcional, são eles: de enxergar, mesmo usando óculos; de ouvir, mesmo usando aparelhos auditivos; de andar ou subir degraus, mesmo usando prótese; de pegar objetos pequenos, como botão ou lápis, ou abrir e fechar tampas de garrafas, mesmo usando aparelho de auxílio; de se comunicar, realizar cuidados pessoais, como trabalhar e estudar devido a alguma limitação nas funções mentais.
Já para identificar as pessoas com autismo, a pesquisa considerou o declarante que respondeu que já foi diagnosticado com autismo por algum profissional de saúde.
Núcleo de Atendimento Multidisciplinar
Em funcionamento há pouco mais de um ano, o Núcleo de Atendimento Multidisciplinar (NAM) Profª Elza Girotto, em Santa Gertrudes, atende mais de 100 alunos. O espaço é voltado à inclusão e ao desenvolvimento de crianças com transtorno do espectro autista e deficiências.
De acordo com informações da assessoria de imprensa da prefeitura, o serviço possui 40 profissionais especializados e realiza 295 atendimentos por semana. Tudo de forma gratuita.
Para ter acesso ao serviço do NAM é necessário:
- Acompanhamento escolar: O aluno deve estar matriculado em uma escola da rede municipal de ensino.
- Encaminhamento pela escola: Professores e equipe pedagógica identificam a necessidade de atendimento especializado (como TEA, deficiências, atraso no desenvolvimento etc.).
- Avaliação da Secretaria de Educação: A escola encaminha a situação para a Secretaria de Educação, que analisa o caso junto à coordenação do NAM.
- Contato com a família: Se o aluno for aceito, a equipe do NAM entra em contato com os responsáveis para agendamento e início dos atendimentos.
Importante: De acordo com a assessoria de imprensa da prefeitura municipal, o NAM é exclusivo para alunos da rede municipal, e o acesso é via escola, não sendo possível agendamento direto por parte dos pais ou responsáveis.